Opinião - Coisas da História

A sigla é a mesma da polícia federal americana: FBI. Já o gênero e as ações da FBI, a Frente Brasileira de Informações, são outra história. Criada em novembro de 1969 por exilados brasileiros na Argélia, a frente tratava de denunciar os crimes da ditadura e de conquistar apoio para uma sonhada derrubada do regime. Não demorou a se espalhar por outros países.
Em tempos de imprensa brasileira sob censura total, a FBI se revelou a primeira iniciativa da esquerda para divulgar notícias que não saíam na imprensa. Um furo pontual à censura havia ocorrido pouco tempo antes, quando o embaixador americano Charles Burke Elbrick foi sequestrado no Rio e sua libertação envolveu a leitura de um manifesto da guerrilha.
O temor da repressão, porém, não se dissipava nem em solo estrangeiro. Única mulher entre os 15 presos políticos trocados pelo embaixador, Maria Augusta Carneiro foi taxativa ao desembarcar na Cidade do México. “Eu não sei nada sobre organização”, respondeu ao repórter que tentou saber da organização que promovera o sequestro, com a participação dela.

Carlos Lamarca, um dos principais líderes da guerrilha, na capa do boletim, em julho de 1970 (Foto: Cedem/Unesp)
Dois meses depois, por iniciativa do governador Miguel Arraes, que se encontrava exilado na Argélia, foi publicado o primeiro boletim mensal da FBI. Destinava-se mais à distribuição na França do que no país africano, cujo governo se opunha à ditadura brasileira. Em Paris, a irmã do governador, a agregadora Violeta Arraes, mostrou-se eficaz na distribuição.
“Nossa arma é a verdade”, anunciou o manifesto de fundação da FBI, que também se comprometia escapar do sectarismo e buscar informações junto às diferentes organizações de resistência ao regime. Com a criação de núcleos da FBI em outros países, o boletim mensal do movimento chegou a ser publicado em português, francês, espanhol, inglês, italiano e alemão.
O antropólogo Mauro Leonel, mais tarde professor da USP, participou da FBI em Paris. “Os boletins foram feitos com regularidade por exilados em mais de uma dezena de países, sempre com o apoio de grupos locais, que punham a cara a bater. Em Paris, ganhamos uma impressora offset e chegamos a funcionar na redação do jornal Politique Hebdo”.

Edição chilena de 1971 analisava as diferentes facções militares brasileiras (Foto: Cedem/Unesp)
Negar os crimes e a própria ditadura era a estratégia adotada na época pelos militares, creditando as denúncias a uma suposta “campanha difamatória contra o Brasil”. Não colou. As denúncias repercutiram, principalmente na Europa. “Diziam que foram essenciais para o endurecimento do Vaticano em relação aos militares”, lembra Leonel.
Na maior parte dos países, o movimento se estendeu até 1975. No Chile, terminou antes, devido ao golpe do general Augusto Pinochet, em setembro de 1973. Dois anos antes, na edição 25, o artigo “Gorilas para todos los gustos” analisava as diversas tendências e grupos em que se dividiam os militares brasileiros. Como o Brasil, o Chile teve de abrigar cenário similar.